Cruzeiro de Boialvo

No cimo de Boialvo existia uma “antiga capelinha, denominada capela do Senhor do Cruzeiro”, com o seu largo, a qual havia de ser “restaurada e adaptada para o culto”, no princípio da terceira década do sec XX. Como se achava “com a devida decência” e fora solicitava autorização para a bênção ao bispo de Coimbra, D. Manuel Luiz Coelho da Silva, este deferia favoravelmente em 1 de outubro de 1923 a petição do pároco, padre Joaquim Rodrigues de Almeida, que foi comissionado para esse efeito. A festa da bênção, a que “assistiram bastantes fieis”, tinha lugar no dia 28 daquele mesmo mês.Esta capela havia de ser demolida em 1941, a contragosto do povo, por iniciativa de Manuel Rodrigues Oliveira, figura preponderante nesse tempo no lugar. Era bastante rico, dava trabalho a muita gente, tinha enorme influência. O conjunto escultórico Senhor do Cruzeiro recolhia à sacristia da igreja de S. Pedro. A capela situava-se um pouco por acima da fonte que, embora em ruínas e datada de 1950, mostra, claramente, a evolução da engenharia para a bombagem da água: lá está uma bomba de roda, do inicio do sec XX, exemplar a preservar, e a bomba de lusalite, também manual, dos meados daquele mesmo século, que veio substituir a de madeira, mas cuja técnica de funcionamento era exatamente a mesma.O largo é arborizado com pés de alecrim, cedros e outras espécies. No momento, é centro de alguma polémica. A Comissão Fabriqueira de S. Pedro declara que é bem da igreja (o terreno acha-se registado, segundo o pároco, padre Victor Gabriel, em nome da igreja sob a denominação, “terreno da Senhora do Cruzeiro”). Aliás, segundo o inventário de 1 de janeiro de 1959, é incluído nos bens da igreja matriz “o largo da Capela do Cruzeiro, no lugar de Boialvo”; por sua vez a diocese diz que lhe pertence e a Junta também reivindica a sua posse. Este impasse vai adiando obras de urbanização. Anos mais tarde, na década de oitenta do sec XX, por devoção das pessoas, foi construída uma capelinha / cruzeiro, formada por um telheiro de quatro águas, cujo telhado assenta num entablamento quadrado suportado por quatro colunas dóricas, em cantaria com espécie de lintel, as quais, por sua vez assentam num murete que se acha adornado com um gradeamento baixo, de ferro, com porta de acesso. Ao centro, pousada em dois degraus, uma colunata, encimada pela imagem de Cristo Crucificado. O interesse deste conjunto reside no facto de cruz e imagem serem talhados a partir de uma única pedra. Todos os anos, é celebrada missa (campal) de festa no primeiro domingo do mês de maio.A imagem, denominada Senhor do Cruzeiro, anda envolta numa tradição secular. Quando foi das invasões francesas, a população escondeu tudo o que podia, não só géneros alimentícios, mas também se preocupou com coisas de valor e estima, como foi o caso desta imagem por que nutria naturalmente grande devoção. Foi buscá-la à capela e escondeu-a em terreno próximo, para ali ficando no esquecimento algum tempo. Um dia, o dono do terreno, que era da família dos Cruzeiros, andava a lavrar e achou-a. Voltava então a ocupar o seu lugar na antiga capela, ate que foi destruída. Só nessa altura terá ganho o nome do Senhor do Cruzeiro, não por pertencer a qualquer cruzeiro, símbolo que não existe em nenhum lugar da freguesia, com exceção de S. Pedro e outro de pouco valor na Senhora das Neves.